Sonho alcançado

De vez em quando acredito que como jornalista não consigo ajudar ninguém. Chego no local da pauta, converso com um ou outro, faço fotos e entro no carro. E acabou. Em Marques de Souza isso ficou mais claro. Acompanhei o drama de famílias que perderam todos os pertences pela fúria do Rio Forqueta (inclusive gente que não teve mais para onde voltar, já que a casa ficou só nas fundações). Foi uma cena bem triste, mas precisávamos estar ali para mostrar o que aconteceu. No trajeto escutávamos até xingões dos moradores. "Alguns ganham dinheiro atráves do sofrimento alheio", diziam. Me escalaram três vezes para ir para a cidade e aos poucos me conformei com a situação. Na verdade, o sentimento era de angústia. Não tinha muito a oferecer do meu apto quase vazio.

Dois dias depois deixei a enxurrada de lado para me concentrar no Caderno dos Bairros. Por estranho que possa parecer consegui ajudar alguém com o bendito impresso. Fiz uma reportagem sobre a situação de uma associação de catadores que se incendiou há um ano. O depósito fica em um dos bairros mais pobres de Lajeado, o Santo Antônio, e já dá para imaginar as condições do local. Não há banheiro por perto e o pessoal precisa ir "até o mato fazer as necessidades". Sem contar que também não existe energia elétrica. Conversei com a presidente, a Dona Terezinha, e fiquei impressionado com a determinação da senhora. Tomava a reconstrução da Associação como meta de vida.

Ao sair de lá troquei o aperto de mão por um beijo no rosto da senhora (acho que ela ficou meio surpresa com o gesto). Voltei para a redação, mas só fui finalizar a reportagem dias depois. Confesso que não sabia como terminar a matéria. Optei por colocar nas últimas linhas um singelo pedido de ajuda: "No final da entrevista, a senhora de unhas bem cuidadas nos agradece a atenção e pede a nossa volta, desta vez com boas notícias". No outro dia recebi uma ligação de um senhor, de nome Rubem. Achei até estranho por que foi para o meu celular. Ele me explicou que tinha lido a reportagem e que queria ajudar, só que queria saber da seriedade dessas pessoas. Vibrei. Disse o que tinha percebido deles, e ele, em seguida, me pediu o que precisavam e comecei a descrever. Coloquei tábuas, pregos e telhas na lista, além do banheiro. "Vamos juntar R$500 a R$1 mil cada um e comprar os materiais de construção", afirmava. Passei o telefone da presidente e desliguei. Antes, agradeci e perguntei se não queria que a gente fizesse um registro. "Não queremos publicidade", rebateu.

Não confirmei com a Dona Terezinha se alguém a tinha procurado, mas espero que sim. Naquele dia percebi que a gente pode ajudar através das palavras. Saí do jornal com a certeza que tinha ajudado ao menos 50 pessoas e encurtado o sonho da senhora. O fim da reconstrução também traria de volta o merecido descanso do final de semana para os catadores, antes exclusivo para reerguer o galpão.

Ps.: A reportagem está online. Acesse www.informativo.com.br/w2w_portal/interna.php?EDA=365&NID=32341

Comentários

  1. Cara, é assim que ajudamos as pessoas. Elas ficam esperando a realização de uma campanha, a movimentação de uma galera para levar doações e tal, mas não. O que devemos fazer é mostrar, de forma sensível, o que os imprevistos da vida estão causando àquelas pessoas. Assim, os demais vão se sensibilizar e ajudar. Parabéns!!!

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